3.2.10

processo produtivo em arquitetura e música - algumas associações por oposição

Entende-se que um percurso analítico dos processos de produção seja uma demanda a princípio muito mais vinculada à Arquitetura do que à música. A obra arquitetônica possui uma expressão muito mais concreta e permanente, em comparação à obra musical. O produto final da arquitetura é evidentemente “mais material” do que aquele que mesmo a orquestra mais completa ou os equipamentos sonoros mais potentes são capazes de realizar. Os valores utilitários dos produtos também são rigorosamente distintos. Estes fatores, de materialidade, permanência e utilidade, incidem diretamente na forma como os processos de produção estão estruturados, tanto em uma arte, quanto em outra.
No caso da música, chama atenção como, ao contrário do que acontece com a arquitetura, praticamente todos os envolvidos na produção da obra de arte são músicos. O compositor, que idealiza a obra – e que pode muito facilmente ser associado ao arquiteto – é músico. Igualmente o é o regente – o primeiro intérprete da obra musical, aquele que prepara a obra para a execução por meio dos ensaios. O regente é, por um lado, como o arquiteto que estende seu trabalho para além da prancheta, ao preparar o cronograma e o planejamento da obra e o projeto executivo. Ao ensaiar uma orquestra, o regente compatibiliza os projetos de todas os naipes (grupos) de instrumentos – e o ensaio é como o próprio projeto executivo, que sistematiza e detalha as informações para o momento da execução. Por marcar presença na linha de frente conduzindo a orquestra durante toda a execução, o regente assume também o papel do mestre de obras.
É simples enxergar como, no passo seguinte, os músicos da orquestra atuam como os peões – pedreiros, eletricistas, encanadores, pintores... – aqueles que de fato executam a obra, por meio de sua própria força e do domínio de seus instrumentos de trabalho. Enfim, tomando-se a orquestra como um arquétipo do Canteiro de Obras da produção musical (erudita), chega-se à constatação feita no início, de que, neste canteiro, todos são músicos.
Este ponto evidencia o quanto o arquiteto encontra-se afastado das fases propriamente executivas da produção da arquitetura. Isto talvez explique um pouco por que os estudos uma análise dos processos produtivos pareça muito mais necessária aos arquitetos do que aos músicos. Por outro lado, pode-se levantar a questão do quanto resta de criação ao músico da orquestra, independentemente do elemento virtuosístico (técnico) que possa caracterizar o seu trabalho. Um outro aspecto considerável é o fato de que, no processo da composição musical, a atuação do músico é solitária – o oposto do que cada vez mais acontece no projeto de arquitetura, processo que envolve às vezes não só uma equipe, mas mais de uma equipe de profissionais, o que torna o processo de produção (e não a linguagem em si) muito mais complexo.
No caso do músico, deve-se lembrar que é comum ter o compositor também na posição de regente ou de executor, ele mesmo, da própria composição. Ao participar da produção final da obra projetada, o músico tem oportunidade de conhecer diretamente os instrumentos de que dispõe para criar e até de analisar. (O musicólogo, analista musical, geralmente também tem formação prática como músico em algum nível). Em um processo desses, a realimentação entre o ato de criação, os atos envolvidos na produção e o produto pronto acontecem de modo praticamente imediato. Os arquitetos estão muito distantes de desfrutar desse privilégio.
Dentre o que se pode concluir dessas associações, está o fato de que os músicos, por participarem ativamente do processo produtivo, encontram um nível menor de tensão e de contradições no decorrer deste processo, além de terem uma oportunidade concreta de se aprofundar nos processos formadores da linguagem musical. Desvendar o que tudo isto pode significar é o desafio proposto para trabalhos futuros, ao se refletir a respeito de uma Análise dos processos produtivos em música. Aos arquitetos, são lançados dados que podem alimentar um debate sobre o que seria e como poderia acontecer uma aproximação entre o ato de projetar e o de executar, e por meio de que processos isto seria possível. Avançar um estudo nessa direção seria buscar a reinvenção da própria atividade no exercício da profissão.

Um comentário:

DioSou disse...

Olá Carolina, bom dia!
Que coisa fantástica é o seu trabalho!
Fiquei impressionado com a documentação que você faz de suas obras, com comentários (através do Blog) e também de seus escritos diversos!
Pensei em divulgar seu farto material entre meus alunos de uma faculdade de arquitetura aqui do Rio de Janeiro. Gostaria de sua aprovação!
Parabéns!!!!
Dionísio Augusto A. N. Souza
http://www.progerengenharia.com.br